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A receita à base de algoritmos do Burger King Brasil

Artigo produzido pela nossa associada, Shipay

Em setembro do ano passado, o Burger King Brasil veiculou um vídeo adaptando a versão do Whopper Mofado, que já havia viralizado nos Estados Unidos, para o Brasil. A imagem de um sanduíche estragado durante dias poderia parecer apenas mais uma campanha, das dezenas que a marca promoveu naqueles meses. Mas naquela, em especial, havia um ingrediente escondido nas entrelinhas.

Para poder comunicar que estava retirando conservantes de seu carro-chefe, o Whopper, e lançar um manifesto a respeito, a empresa travou, nos bastidores, uma corrida de dados e desenvolvimento de fornecedores que foi do pão aos condimentos. 

Até aqui, você se perguntaria, o que a busca por um pão sem conservantes tem a ver com transformação digital? A resposta é: tudo. Apenas para conseguir encontrar a combinação correta do novo Whopper foram necessários dois anos de coleta, gestão e aplicação de dados, além de pesquisas, ajustes e prototipagem. Esse exemplo ilustra o processo narrado por Iuri Miranda, CEO do Burger King Brasil, de orientar os dados à compreensão dos hábitos e preferências dos consumidores. “Nesta jornada, compreendemos que os clientes não buscam somente qualidade, mas experiências, principalmente personalizadas e individualizadas. E o nosso objetivo é fazer com que o desejo do público de ser entendido pelas empresas faça sentido.”

Iuri Miranda, CEO do Burger King Brasil
Iuri Miranda, CEO do Burger King Brasil

Recentemente, no início de fevereiro, esse caminho de dados se tornou ainda mais claro na estratégia da companhia. Ao lançar o Clube BK, aplicativo de promoções e vantagens para os consumidores mais fiéis, a empresa afirma ter dado mais um passo para a criação de um ecossistema digital. “A tecnologia exerce um papel fundamental na interface com o consumidor. 

Hoje, nós já usamos a inteligência artificial como um ativo da companhia, mas a revolução tecnológica tem, também, como um dos objetivos, fazer da nossa base de dados uma ferramenta relevante para que possamos criar cada vez mais personalização”, explica Iuri.

MARKETING E TECNOLOGIA

Para levar adiante esse processo de digitalização foram necessárias mudanças estruturais e, em alguns casos, a quebra de silos. Uma delas, foi a união de três áreas. Desde janeiro deste ano, tecnologia, vendas e marketing estão sob a responsabilidade de Ariel Grunkraut, atual chief marketing technology officer (CMTO) da companhia, cargo este, aliás, inédito para a empresa. “Uma experiência multicanal passa, essencialmente, por esses três pilares, porque eles são interligados na rotina dos consumidores. Mas não é só isso, as pessoas estão mais atentas do que nunca, mais criteriosas e exigentes. Nossa experiência em marketing nos permitiu visualizar esse ponto latente da transformação nos hábitos de consumo. 

Logo, o papel principal, neste momento, é interligar as áreas para unir todo esse conhecimento do comportamento do público”, explica Iuri. 


O app do BK tem 25 milhões de usuários e a ideia é que ele se torne um hub digital para a marca

Grunkraut destaca que tecnologia, geralmente, ainda é encarada como custo e que a lógica adotada nesta mudança foi desconstruir essa visão, passando a olhar para o ativo tecnológico como um meio de oportunidades e, inclusive, de aumento de receitas.

“A partir de todas essas premissas, a tecnologia nos permite atuar com uma jornada definida e sem fricção. O desafio, no entanto, é conectar a tecnologia com a criatividade”, explica Grunkraut. Essa conexão entre criatividade e resultado também é apontada por Eduardo Tomiya, fundador da TM20 consultoria, como crucial.  

“Há de se ressaltar que o Burger King tem como essência gerenciamento de dados como um pilar estratégico muito forte que já vem, inclusive, das suas dinâmicas de campanhas digitais e com um rápido teor de respostas”, diz Tomiya, reforçando que campanhas provocativas e que gerem repercussão só possuem sentido de existir se tiverem, sobretudo, a área de vendas alinhada à estratégia.

“Hoje, já usamos a inteligência artificial como um ativo da companhia, mas a revolução tecnológica tem, também, como um dos objetivos, fazer da nossa base de dados uma ferramenta relevante para que possamos criar cada vez mais personalização” Iuri Miranda.

O OLHAR PARA O ECOSSISTEMA

O processo narrado inicialmente por Iuri não se sustenta caso também não conecte parceiros que estejam alinhados ao mesmo ritmo. No caso do lançamento do Clube BK, por exemplo, foi necessário um grau de envolvimento da agência digital, a Ginga, que, em outros contextos, teria ficado apenas na comunicação, mas extrapolou para a criação de uma plataforma de negócios. 

Em 2018, a agência realizou para o Burger King um processo de consultoria de maturidade digita levando em consideração quatro dimensões: fundação digital, touchpoints de produtos e serviços digitais, conteúdos, comunicação e experiências de marca e dados, mídia e relacionamento. 

Uma das etapas da consultoria, como explica Paulo Martinez, COO da Ginga, consistia em mapear frentes de oportunidades que o Burger King poderia desenvolver para acelerar ainda mais a sua jornada de transformação digital. “Desse contexto emergiu, entre outras iniciativas, a ideia de um programa de benefícios.

O Burger King já tinha os principais ingredientes necessários, faltava conectar sua atuação em torno de fãs e clientes da marca, em uma filosofia mais parecida com as empresas de tecnologia nativas digitais, ou seja, passando a enxergar clientes como assinantes da marca, em uma visão de lifetime value e 100% pautada em inteligência de dados, em contraponto à visão tradicional de resultados de vendas por volume.” 

“O ponto de atenção quando o assunto é metodologia ágil para grandes empresas que começam a trabalhar desta forma é entender que essa dinâmica não é delegável a uma área, mas ela deve permear toda a empresa. É o modo como o trabalho deveria ser feito, somente assim é possível ver frutos ao se trabalhar com método ágil e resolver o problema do melhor jeito possível”, Barbara Soalheiro.

O uso de metodologias como user centered design, design thinking, lean e agile, necessários neste projeto, também foram fundamentais na dinâmica, explica Martinez.

Bárbara Soalheiro, fundadora da consultoria Mesa, alerta que, seja no caso do Burger King, ou de qualquer empresa em processo de transformação digital e incorporação de métodos ágeis, há que se levar em conta que é menos sobre o processo e mais sobre o resultado. “O ponto de atenção quando o assunto é metodologia ágil para grandes empresas que começam a trabalhar desta forma é entender que essa dinâmica não é delegável a uma área, mas ela deve permear toda a empresa. É o modo como o trabalho deveria ser feito, somente assim é possível ver frutos ao se trabalhar com método ágil e resolver o problema do melhor jeito possível”, explica.


A startup Aiknow, em parceria com a ConectCar, desenvolveu uma tecnologia de gestão de drive-thru baseada em inteligência artificial

Dos projetos já testados dentro do ecossistema do Burger King estão, por exemplo, o desenvolvimento de uma solução de inteligência artificial, pela Aiknow, em parceria com a ConectCar, que permite a gestão de drive-thru. Em outras palavras, a tecnologia traz informações em tempo real sobre o comportamento dos clientes neste canal. O projeto, em fase piloto, deverá ser aplicado em outras plataformas da rede. Outra startup, a Shipay, plataforma de integração de carteiras digitais como Pix, Mercado Pago e Ame, desenvolveu uma aplicação para que o Burger King receba PIX, de qualquer banco, e carteiras digitais por meio do WhatsApp. Já a Analytics2Go, desenvolveu um produto baseado em inteligência artificial que permite vendas sugestivas, cross-sell, no termo técnico, de maneira integrada em todos os canais de vendas. 

“Não é fácil convencer empresas de fast-food de que conseguimos converter essa oportunidade em receita incremental porque há muito tempo elas têm tentado explorar essa oportunidade sem sucesso”, explica Rafael Fanchini, chief product officer da Analytics2Go.

Ainda que atue com startups de vários segmentos, as foodtechs, startups que, de certa forma, poderiam ajudar o Burger King na busca pelo pão mencionado no início da reportagem, tiveram um salto global, em termos de investimentos, de US$ 60 milhões, em 2008, para US$ 1,3 bilhão, em 2018, de acordo com a Pitchbook. A NotCo, por exemplo, startup que utiliza inteligência artificial para mapear ingredientes de origem vegetal em composição de leites e carnes, fechou uma parceria com o Burger King Chile na oferta de hambúrgueres plant based. 

DIGITAL EM ESCALA

Na última divulgação de resultados do Burger King, considerando o terceiro trimestre de 2020, a receita dos canais digitais, o que inclui delivery, totem e BK Express, subiu de R$ 43 milhões para R$ 136, 3 milhões. 

Essa alta de 217% e uma representatividade de 22,7% na receita total, como explica o CEO, reflete um novo normal em que os restaurantes e as novas plataformas vão conviver em equilíbrio contando com cada vez mais relevância do digital. 

“Mesmo com a retomada significativa do consumo no balcão, o digital segue em crescimento acelerado.

Os totens de autoatendimento, por exemplo, têm sido uma importante ferramenta para dinamizar as interações com nossos clientes e já representam 12,9% das nossas vendas de balcão”, explica Iuri. Mesmo com a reabertura dos shoppings, por exemplo, o delivery do Burger King atingiu R$120,1 milhões, alta de 210,1% em relação ao mesmo período do ano anterior”, explica Iuri. 

“Há de se ressaltar que o Burger King tem como essência gerenciamento de dados como um pilar estratégico muito forte que já vem, inclusive, das suas dinâmicas de campanhas digitais e com um rápido teor de respostas”  Eduardo Tomiya

Ariel reforça que todo esse contexto altera em muito o perfil das equipes. Hoje, menciona o CMTO, dentre as mais de 100 pessoas da área tecnologia, estão profissionais que vão desde arquitetos, designers, cientistas de dados, desenvolvedores e engenheiros. 

No ano passado, inclusive, o Burger King levantou R$ 500 milhões com o objetivo de destinar parte destes recursos à área de tecnologia. 

“Sabemos que um dos efeitos da pandemia foi a aceleração digital do mercado em si e o desafio é transformar essa característica universal, da digitalização, em um combustível para que possamos agilizar processos”, conclui Iuri.

SOBRE O AUTOR: Luiz Gustavo Pacete é editor-contribuinte da Fast Company Brasil

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